Beautiful Beginning - Capitulo 2
Estávamos em San Diego há exatas duas horas e eu já estava
arrependido de não ter aceitado a proposta de Demi de fugirmos para Las Vegas.
Como se pudesse ouvir meus pensamentos, essa mesma mulher se virou no assento
ao meu lado. Eu podia sentir sua atenção, a pressão de seu olhar enquanto me
observava e tentava dissecar todos os meus grunhidos de insatisfação. – Por que
você está nervoso? – ela finalmente perguntou. – Estou bem – eu respondi,
tentando parecer desinteressado, mas falhando miseravelmente. – Não é o que
parece, considerando a força com que você está segurando o volante. Franzi
ainda mais o rosto e imediatamente parei de segurar a direção com tanta força.
Estávamos a caminho do jantar em que a maior parte de nossas famílias iria se
encontrar pela primeira vez. Parentes vieram de toda parte: Michigan, Flórida,
Nova Jersey, Washington, até mesmo do Canadá. Muitos deles eu não via há mais
de vinte anos. Ao todo, mais de trezentas e cinquenta pessoas chegariam nos
próximos dias. Só Deus sabia o que teríamos pela frente. Num bom dia, eu odiava
conversa fiada. Na semana anterior ao maior evento da minha vida, eu estava
morrendo de medo de me comportar como o maior cretino do mundo e fazer todo
mundo ir embora antes mesmo da cerimônia. Inclinando-se para frente para que eu
olhasse para ela, Demi perguntou: – Você não está entusiasmado para essa
semana? – Sim, é claro. Estou apenas com medo de hoje à noite. Não sei como vou
lidar com ter que fazer todo o social. – Meu palpite é que você não vai lidar
muito bem – ela disse, dando um soquinho em meu ombro. Eu ri um pouco e lancei
um olhar de desdém. – Valeu, ajudou muito. – Olha, apenas espere até você
conhecer minhas tias – ela disse, beijando meu ombro no mesmo lugar onde havia
dado o soco. – Vai ser a distração de que você precisa. O pai de Demi havia
viajado da Dakota do Norte com suas duas irmãs excêntricas. As duas haviam
recentemente passado por divórcios, e Demi prometera que elas tinham o
potencial para ser o maior desastre da semana. Eu achava que era cedo para
entregar esse troféu: Demi ainda não conhecia meu primo Bull. – Você vai se
esquecer de tudo e só se preocupar com o que elas vão aprontar em seguida, e de
quanto dinheiro você vai precisar para pagar a fiança – Demi começou a mexer no
rádio, parando numa musica pop estridente. Virei para ela, concentrando uma
vida inteira de ódio à música pop em meu olhar. Satisfeita por me deixar
irritado o bastante, ela se recostou no banco. – Então, o que mais está
irritando você? Você não está tendo dúvidas sobre se casar comigo, não é?
Respondi com outro olhar que dizia Você está maluca? – Certo – ela riu. –
Então, fale comigo. Diga o que está se passando nessa sua cabecinha.
Peguei sua mão e entrelacei nossos dedos. – Só estou preocupado
com o caos que se anuncia – eu disse, encolhendo os ombros. – Este casamento se
tornou uma coisa tão enorme. Você sabia que minha mãe enviou quatorze mensagens
de texto desde que entramos no avião? Quatorze. Com coisas tipo onde podemos
tomar café em San Diego, até será que o Bull pode depilar as costas no hotel?
Como se eu soubesse! Você disse isso ontem: o casamento se tornou uma entidade.
Não acredito que estou falando isso, mas agora estou pensando se você estava
certa quando sugeriu que fôssemos para Las Vegas. Ela me respondeu com seu
clássico sorrisinho de satisfação. – Na verdade, acho que eu disse “correr”
para Las Vegas. Tipo, fugir mesmo. – Certo. – Sabe, não estamos tão longe do
aeroporto – ela lembrou, fazendo um gesto para a janela por onde ainda podíamos
ver aviões decolando e pousando. – Não é tarde demais para escapar. – Não me
tente – eu disse, pois por mais que suspeitasse estarmos indo em direção a um
desastre, eu não queria ir embora de verdade. San Diego sempre foi especial para
nós: foi onde eu parei de ser um idiota e finalmente me permiti amar Demi. Foi
onde a Demi finalmente me deixou amá-la. E, meu Deus, já tinham realmente se
passado dois anos? Como isso era possível? Parecia que ontem mesmo eu estava
discretamente checando a bunda da Srta. Mills no escritório. Nós tínhamos
estado aqui mais uma vez, claro, para escolher o local da cerimônia. E aquela
viagem tinha sido tão atrapalhada, mas desta vez o peso era muito maior.
Estávamos ali para nosso casamento. Apesar de sua invasão à minha despedida de
solteiro, apesar de termos comprado um apartamento juntos em Manhattan, e
apesar do anel no dedo de Demi, foi só naquele estranho momento de nervosismo
que a ficha começou a cair. Estávamos nos casando. Quando eu fosse embora dali
de novo, Demi seria minha esposa. Puta merda. Passei minha mão trêmula em minha
testa suada. – Você está quieto demais. Por acaso esse silêncio significa que
você está mesmo considerando fugir? – Demi perguntou. Eu sacudi a cabeça. –
Claro que não – disse, apertando sua mão. – Estamos aqui. E não existe chance
alguma de você não andar até o altar. Eu lutei demais por você. – Pare com
isso, Joe. É muito mais fácil lidar com você quando está se comportando como um
cretino. – E eu já aguentei você demais – eu acrescentei, sorrindo quando senti
seu punho acertando meu ombro mais uma vez. – Mas sinto que deveria avisar você
de novo. Alguns membros da minha família são um pouco… – Malucos? Do tipo que
constroem uma fábrica de vitaminas na garagem? Do tipo que pagam milhares de
dólares para anunciar em revistas de geriatria? Franzi o rosto. – Como é? Quem
fez isso? – Seu primo Bull – ela respondeu. – Kevin me contou algumas histórias
no telefone. Aparentemente é sua nova empreitada. Ele vai tentar encontrar
investidores oferecendo o
negócio para o Will e o Max. – Por que eu estou surpreso?
Ela deu de ombros. – Famílias são sempre um problema, Joe. Se não fosse assim,
ninguém nunca sairia de casa. E os meus familiares não são lá muito normais
também. Você sabe que minhas tias são um pouco… Vamos apenas dizer que elas
realmente vão se dar bem com os Jonas. Espero que você tenha trazido seu tênis
de corrida. – Bom… – eu comecei a dizer, mas parei quando ela cruzou as pernas.
– Demi? Ela mexia na perna, arrumando uma meia que não existia. – Humm? – Que
diabos você está usando? – Gostou? – ela disse, erguendo o pé e o movendo de um
lado a outro. Seus sapatos pareciam realmente perigosos. Saltos muito altos e
couro muito azul-escuro. – Você estava usando isso quando saímos do hotel? –
Sim. Você estava ao telefone com seu irmão. Nunca fui de prestar muita atenção
no que Demi vestia, mas a movimentação dentro da minha calça me dizia que eu
definitivamente já tinha visto esses sapatos antes – sobre meus ombros, se eu
não estava enganado. – Onde eu já vi esses sapatos? – Ah, sei lá – maldita
mentirosa. – Em casa? Em casa, em nosso quarto. Com a caixa que guardávamos
debaixo da cama. E as coisas que fazíamos quando tirávamos a caixa de lá.
Lembrei da noite em que ela tinha usado esses sapatos, quase dois meses antes.
Nós não nos víamos há semanas e eu não conseguia tirar as mãos dela. Ela
apanhara os sapatos junto a algo novo que queria tentar: um frasco de cera
quente. Eu ainda podia sentir o calor de quando ela despejara a cera sobre a
minha pele e os arrepios que irradiaram pelo meu corpo quando a cera se
acumulava num ponto. Ela me provocou por tanto tempo que eu cheguei a prometer
que lhe daria café da manhã na boca de joelhos no dia seguinte. Gozei tão forte
que quase apaguei naquela noite. – Você está fazendo isso para me ferrar, não
é? Por causa da abstinência até o casamento, certo? – Com certeza. Encontramos
uma vaga para estacionar a apenas um quarteirão do restaurante Barbarella, no
bairro de La Jolla, e desci do carro para abrir a porta para Demi. Tomei sua
mão e fiquei olhando enquanto ela saía, com suas pernas bronzeadas que não
acabavam mais e os sapatos que poderiam facilmente empalar uma pessoa. – Você é
diabólica – eu disse. – Eu me sinto como uma noiva defendendo minha virgindade
antes do casamento. – Bom, então sinta-se à vontade para desistir dessa ideia –
ela disse, ficando na ponta dos pés para me beijar. Eu gemi, mas de algum jeito
consegui me afastar. Então, nós dois olhamos na direção do restaurante. – Aqui
vamos nós… –
Antes de chegarmos nós já podíamos ouvir nossos pais
conversando em uma mesa no pátio do restaurante. – Você precisa se certificar
de que elas vão sentar juntas – dizia o pai de Demi. – Besteira, Eddie, elas
vão ficar bem – meu pai, sempre o diplomata. – Denise pensou bastante sobre a
disposição dos lugares e ela sabe o que está fazendo. Tenho certeza de que suas
irmãs são encantadoras. Vamos deixar que os outros tenham uma chance de
conhecê-las. – Você quer que elas fiquem sozinhas com outras pessoas? Acho que
você não entendeu bem a situação, Paul. Minhas irmãs são malucas. As duas
acabaram de se divorciar e estão loucas para conhecer solteiros. Elas vão caçar
todos os homens disponíveis em um raio de dez quilômetros se você permitir.
Segurei Demi na porta do restaurante, pousando minhas mãos em seus ombros e
olhando em seus olhos castanhos. – Você está pronta para isso? – perguntei. Ela
subiu na ponta dos pés de novo e beijou meu rosto. – Não, não estou. Tomei sua
mão e entramos no restaurante a tempo de ver meu pai rindo. – Você não acha que
está exagerando um pouco? Eddie suspirou. – Queria estar. Eu… – Ah, até que
enfim – Kevin disse, interrompendo a conversa e se dirigindo até mim. Nossos
pais olharam em nossa direção enquanto Kevin continuou: – Eu já estava ficando
preocupado, achando que vocês dois não apareceriam e eu teria que arrastá-los
pelados daquele hotel. – Que imagem horrível – eu disse, abraçando meu irmão. –
E por causa disso, vou banir você do meu andar. – Joe – meu pai disse e me
abraçou em seguida. – Eddie e eu estávamos discutindo o arranjo dos lugares. –
E o desastre que seria deixarmos Judith e Mary separadas – Eddie acrescentou,
direcionando as palavras para Demi. Demi abraçou meu pai e depois foi abraçar o
dela. – Denise não vai gostar do que vou falar agora – ela disse para meu pai
–, mas tenho que concordar com o meu pai. Deixe as duas juntas; é melhor que
não dominem mais espaço do que o necessário. Teremos menos fatalidades assim.
Com isso resolvido, puxei meu pai para o lado para deixar Demi ter um momento a
sós com Eddie. O restaurante ficava à beira-mar, e minha mãe havia fechado o
lugar inteiro. Eu tinha que admitir que era perfeito. Escondido numa pitoresca
vizinhança, o restaurante era inteiro cercado de jardins meticulosamente
cuidados, e toda superfície parecia coberta com adoráveis plantas. Naquele
momento, com o sol se pondo, a grande área ao ar livre onde ficavam as mesas
cintilava com linhas de pequenas luzes brancas. As mesas estavam começando a
ficar cheias, e eu percebi que não conseguia identificar nem metade das pessoas
que estavam sorrindo em nossa direção. – Quem diabos são essas pessoas? – Quer
falar um pouco mais alto? Sua tataravó provavelmente não ouviu. E eles são da
família. Primos, tias… sobrinhos de quarto grau – ele
franziu as sobrancelhas quando olhou para a fila que se formava no bar. – Na
verdade, nem eu sei direito. Aqueles ali já estão bebendo, então eles devem ser
da família da sua mãe – ele apertou meu ombro. – Não diga a ela que eu falei
isso. – Ótimo. Mais alguém? – Acho que sim – meu pai disse. – Seus tios estão
aqui. Ainda não vi seus primos. Eu estremeci por dentro. Kevin e eu passamos a
maior parte de nossos verões com nossos dois primos, Brian e Chris. Brian era o
mais velho dos quatro primos, e o mais sério e calado, bem parecido comigo.
Éramos muito próximos. Mas Chris – ou Bull, como insistia em ser chamado –
fazia qualquer um querer fugir. Minha mãe costumava dizer que o Chris apenas queria
ser igual a nós, e gostava desse apelido para poder se juntar ao time do “B”:
Brian, Joe, Bull. Sempre achei que isso era besteira. Afinal de contas, Kevin
começava com “H”, e a capa térmica de cerveja personalizada que Brian sempre
levava para as festas, com suas camisas desabotoadas e correntes de ouro,
sugeriam que ele não se importava nem um pouco em ser uma pessoa única. Chris
gostava da ideia de ser chamado de Bull simplesmente porque ele era um idiota.
– Tenho certeza de que o Bull está animado para encontrar você – meu pai disse
com um sorrisinho. – Vou ficar de olho – disse. – E tenho certeza de que Lyle
se lembrou de um monte de novas histórias da marinha para contar durante o
jantar. Talvez até fale sobre os resultados do exame de próstata. Meu pai
assentiu, segurando uma risada enquanto acenava para alguém do outro lado do
pátio. O irmão mais velho de meu pai, Lyle, pai do Bull, parecia não ter noção
de nada. Ao longo dos anos, perdi a conta de suas histórias absurdas sobre a
marinha, funções corporais nojentas, pessoas no campo que mantinham “relações”
com animais e as várias verrugas que sua esposa precisou remover das costas. –
Talvez eu devesse sugerir que ele conte uma dessas histórias durante o brinde,
o que você acha? Rindo, eu disse: – Eu darei a você um dólar inteiro se você
fizer isso, pai. Minha mãe se aproximou, beijando meu rosto antes de lamber o
polegar e esfregar o que imaginei que fosse uma grande mancha de batom. Desviei
e apanhei um guardanapo na mesa. – Por que você não vestiu seu terno
azul-marinho? – ela perguntou, arrancando o guardanapo da minha mão para ela
mesma limpar meu rosto. – Oi, mãe. Você está linda. – Oi, querido. Eu gosto do
terno azul-marinho muito mais do que desse. Olhei para o terno Prada cinza que
eu usava alisando o paletó. – Eu gosto deste – além disso, arrumei minhas malas
às duas da madrugada embriagado pelo sexo, pensei. – Azul seria mais apropriado
para hoje – ela estava praticamente tremendo de tão nervosa. – Com esse parece
que você está indo para um funeral. Meu pai ofereceu seu coquetel e ela tomou
tudo de um gole só antes de voltar para a mesa. – Bom, isso foi divertido – eu
disse e meu pai riu. Demi se juntou a nós – claramente um pouco exasperada por
ter lidado com seu pai – e
começamos a circular pelo pátio, cumprimentando a todos e
reencontrando velhos amigos e familiares. Um pouco depois, minha mãe anunciou
que o jantar seria servido, então todos começaram a entrar no salão. Encontrei
nossos lugares perto do centro do salão. Demi sentou-se à minha direita, com
seu pai ao seu lado. Meu pai aparentemente aceitou o conselho de Eddie, pois as
tias da Demi – Mary e Judith – estavam sentadas juntas, rindo muito e fazendo
um escarcéu. Chris… Bull fez sua grande entrada enquanto todos se sentavam,
gritando meu nome e erguendo sua lata de cerveja – com a velha capa térmica, é
claro. Seus olhos mediram Demi mais devagar do que seria humanamente possível,
e depois ele fez sinal de “joia” para mim. Pensei em depois pedir a um amigo
que trabalha na Receita para colocá-lo na malha fina. Só de brincadeira, é
claro. Ou não. O jantar consistia em filé de salmão ao molho beurre blanc, purê
de batata e tomate. O prato estava perfeito, e quase conseguia me distrair de
toda a conversa ao redor. – Você está brincando? – Bull gritou do outro lado do
salão para uma tia de segundo grau da família de minha mãe. – Você só pode
estar brincando. Os torcedores dos Eagles passam a vida inteira sentindo que
não recebem o crédito que merecem. Você quer atenção e elogios? Então vença
pelo menos um jogo! É isso que estou tentando dizer – Bull tomou um gole
gigante de cerveja e segurou, mas não muito, um grande arroto. – E outra coisa,
você é velha, então deve saber a resposta para isso: por que diabos o programa
Roda da Fortuna ainda existe? Você sabia que eles têm até um site onde você
pode vestir a Vanna White, com se ela fosse uma maldita boneca? Não que eu
mesmo tenha entrado no site… – ele olhou para cada um dos infelizes ao redor
que escutaram ou não seu deslize. – Mas que diabos é tudo aquilo? E vou dizer
uma coisa, ela já está meio velha, mas a verdade é que se eu encontrasse uma
mulher tão gostosa daquele jeito para andar por aí acenando para os carros como
ela faz na tevê… – ele imitou o gesto com as mãos. – Você sabe, eu faria uma
fortuna. – Meu Deus – Demi sussurrou em meu ouvido. – Já temos o primeiro
desastre da noite. Tomei um gole da minha bebida. – Eu avisei. – Você cresceu
com esse cara? Confirmei, estremecendo enquanto tomava o resto da bebida num
único gole que desceu queimando. – Ele sempre foi assim? Confirmei de novo,
suspirei e depois limpei a boca com o guardanapo. Demi olhou ao redor do salão,
primeiro para meu primo Brian, que sempre esteve em forma e era considerado um
homem bonito por todos. Depois olhou para meu pai e seus irmãos, Lyle e Allan,
os dois ainda muito bonitos para sua idade. Também olhou brevemente para Kevin
e para mim, antes de voltar a olhar para Bull. Eu podia praticamente ver sua
mente mapeando os genes da família Jonas. – Você tem certeza de que ninguém
pulou a cerca na sua família? Tipo, não há chance de ele ser filho do
leiteiro…? Eu explodi numa risada tão alta que quase todo mundo no restaurante
olhou para mim. – Preciso de outra bebida – eu disse, momentaneamente inclinando
a cadeira apoiada nas duas pernas de trás. Meu celular começou a vibrar no meu
bolso e, quando apanhei, estava cheio de mensagens
da minha mãe. Querido, seu cabelo está uma bagunça. Eles
estão servindo o DeLoach Pinot? Achei que tínhamos deixado o Preston Carignane
na mesa de vinhos. Diga para seu pai parar de apresentar a tia Joan como a
Garimpeira. Não sei por que ela está usando tanto ouro, mas ele está sendo
deselegante. Escapei para o bar em busca de uma dose de Johnny Black. Também
aproveitei para verificar por onde poderia escapar se fosse preciso – eu amo
minha família, mas, meu Deus, essas pessoas são malucas. Alguns instantes
depois, senti um toque em meu ombro. – Então, você é o cara que está se casando
com Demi. – Isso se ela não cair na real e fugir correndo… – disse, virando
para as duas mulheres atrás de mim. Imediatamente eu identifiquei quem eram. –
Vocês devem ser as tias da Demi, certo? Uma delas assentiu, e todo seu cabelo
armado balançou junto. – Eu sou Judith – ela disse, depois apontou para sua
irmã. – Esta é Mary. Judith tinha um cabelo que parecia algum tipo de doce:
armado e com muita tintura vermelha, igual a um algodão doce. Poderia ser
apenas impressão, mas juro que ela também cheirava a morango. Sua pele ainda
era relativamente lisa considerando sua idade – sessenta e pouco, se Demi
estava certa – e os olhos castanhos pareciam sagazes enquanto olhavam para mim.
Mary possuía as mesmas feições de sua irmã, mas seu cabelo era muito mais
controlado e discreto. E embora Judith fosse tão alta quanto Demi, batendo no
meu queixo, Mary não tinha mais do que um metro e meio. Estendi a mão para
cumprimentá-las. – É um prazer finalmente conhecê-las – disse, sorrindo
educadamente. – Demi me contou histórias maravilhosas sobre vocês. Em vez de
apertar minha mão, as duas me puxaram ao mesmo tempo para um longo abraço. –
Mentiroso – Mary disse com um sorriso. – Nossa sobrinha diz muitas coisas, mas
não fica fazendo elogios falsos por aí. – Ela me contou que costumava passar os
verões com você. A frase que ela mais usava era “elas são muito divertidas” –
achei melhor não acrescentar “e malucas”. – Bom, nisso eu posso acreditar. –
Vocês estão gostando de San Diego? – eu perguntei ao me recostar no bar. Eu
podia ver a Demi com o canto do olho, e como eu esperava, Bull havia sentado em
meu lugar para fazer companhia a ela. Parte de mim queria ser seu cavaleiro e
resgatá-la, mas uma parte maior pensava diferente: se havia uma mulher no mundo
que não precisava ser resgata, essa mulher era Demi. – Oh, estamos nos
divertindo muito – Judith disse, trocando olhares com sua irmã. – E vamos
continuar assim. Você sabia que essa é a primeira vez em trinta anos que nós
duas estamos solteiras? Esta cidade não sabe o que a espera. Nós vamos
compensar o tempo perdido… ou morrer tentando. Não consegui evitar uma risada.
Estava começando a perceber que aquela honestidade brutal era um traço da
família Mills. – Então, qual é o plano? – perguntei. – Vocês vão passar um
tempo na praia e conquistar alguns corações?
– Algo desse tipo – Mary disse, dando uma piscadela. Judith
ficou ao meu lado e baixou o tom de voz. – Conte sobre sua família – ela pediu,
ansiosa e olhando o salão com atenção. – Você só tem um irmão? E tios? Algum
solteiro? Eu sacudi a cabeça, rindo novamente. Eddie realmente estava certo. –
Apenas um irmão. E desculpe, mas com exceção daquele que está falando com minha
noiva – elas olharam para Bull e desanimaram um pouco – todos os homens estão
comprometidos. – Oh, meu Deus – ouvi a voz da Judith, repentinamente suave.
Segui seu olhar até a porta da frente, por onde Will e Hanna tinham acabado de
entrar. Num instante, Demi e Sara praticamente pularam em cima de Hanna,
deixando Will com aquele sorrisinho estúpido que agora nunca saía de seu rosto.
Eu sentia falta de seu jeito irônico. Sentia falta de suas piadinhas sobre
casais. Deus, agora ele mesmo estava totalmente enlaçado. Ele me encontrou e
aparentemente leu meus pensamentos, pois me mostrou o dedo do meio. E de
repente, mesmo sabendo que era errado e que Demi iria me matar se descobrisse,
comecei a pensar num plano. Quer dizer, era impossível não fazer isso. – Quem é
aquele ali? – Judith perguntou quase sem voz e com jeito de quem estava prestes
a ter um ataque de asma. – Aquele é o Will. Ele trabalha com o Max, aquele
britânico com a noiva grávida. – Ele está disponível? Judith perguntou ao mesmo
tempo em que Mary dizia: – Ele é hétero? Eu podia sentir minha consciência
tentando me dizer alguma coisa. Uma pequena parte de mim estava tentando me impedir
de fazer o que eu estava prestes a fazer, insistindo que essa não era uma boa
ideia. – Ah, ele é definitivamente hétero – eu disse. E não era mentira. – E
ele é muito divertido. Muito, muito divertido – tecnicamente também não era
mentira. Mary apertou meu braço e perguntou: – Quem é a garota com ele? –
Aquela é a Hanna. Ela é… uma velha amiga da família – ainda não era mentira. –
Vocês deveriam ir se apresentar. – Ele não é casado? – Mary perguntou, com seu
estojo de maquiagem nas mãos e retocando o batom. Aquelas mulheres eram
determinadas. – Casado? Nãããooo. Definitivamente não é casado – também não era
mentira. – Ótimo – as duas disseram juntas. Olhei rapidamente para os lados
antes de envolver as duas em meus braços e dizer baixinho: – Vou contar um
segredo para vocês, mas vocês não podem contar para ninguém que fui eu quem
falou – olhei para cada uma e elas assentiram, com olhos arregalados e
animados. – Nosso amigo Will é um cara selvagem. Ele é insaciável e tem
reputação de ser bom naquilo, se é que vocês me entendem. Só que tem uma coisa.
Ele gosta de mulheres experientes. E gosta quando elas vêm em pares. As duas
pararam de respirar e se entreolharam. Tive a sensação de que uma longa
conversa
telepática aconteceu antes de elas voltarem a olhar para
mim. – Entenderam? – eu perguntei. – Oh, nós entendemos – Mary disse. Eu vou
acabar no inferno por causa disso. Fiquei olhando enquanto Judith e Mary foram
em direção ao Will. Hanna, Demi e Sara já não estavam mais com ele. Ele estava
sozinho e vulnerário, perfeito. Me ocorreu que, para fazer isso funcionar,
teria que ganhar tempo com a pessoa mais importante para essa missão. Procurei
por Hanna e a encontrei voltando dos fundos, ajeitando seu vestido azul-safira.
Eu praticamente corri até ela. – Como você está? – eu falei alto demais e com
muito entusiasmo para alguém que acabou de sair do banheiro. Ela se surpreendeu
e parou imediatamente. – Joe – ela disse, pressionando a mão no peito. – Você
me assustou. – Oh, desculpe. Só queria uma chance de conversar com você antes
de as garotas a sequestrarem de novo. – Humm, ceeeerto… – ela disse, olhando ao
redor e claramente confusa com minha concentração nela. – Como foi o seu voo? –
eu perguntei. Ela relaxou e sorriu, tentando olhar sobre meu ombro para onde
Will estava sentado, provavelmente no meio das coroas. Dei um passo para o lado
para bloquear sua visão. – Foi… – ela começou a dizer. – Bom, bom – eu disse,
percebendo tarde demais que nem a deixei terminar de responder. – Olha, eu
queria falar uma coisa para você – seja casual, Joe. Aja como se não fosse nada
demais. Fique calmo. Seus lábios se curvaram num sorriso curioso. – Certo. –
Você sabe como o Will é cheio de querer pregar peças – ela assentiu e eu
continuei. – Eu acabei de fazer uma coisa para me vingar e eu juro – disse,
pousando uma mão em seu ombro –, eu juro, Hanna, que você vai achar hilário…
eventualmente. – Eventualmente? – Com certeza. Eventualmente. Ela me olhou com
os olhos cerrados. – É só uma pegadinha, né? Nada de cabeça raspada ou
cicatrizes? Eu me afastei e olhei em seu rosto. – Isso foi uma pergunta muito
específica. Cicatriz? Não, não, não. É uma pegadinha inocente – mostrei meu
melhor sorriso, aquele que a Demi dizia que fazia calcinhas irem direto para o
chão. Mas aparentemente isso apenas deixou Hanna mais desconfiada. Seus olhos
ficaram ainda mais cerrados. – O que eu preciso fazer? – Nada – eu disse. –
Provavelmente você vai testemunhar umas coisas estranhas, mas… apenas aja
naturalmente. – Então basicamente eu tenho que fingir que não sei de nada.
– Exatamente. – E isso vai ser engraçado? – Vai ser hilário.
Ela pensou por uns dez segundos antes de estender a mão. – Combinado. – O Hotel
Del Coronado foi construído em 1888 nas areias finas das praias de Coronado
Island. Com seus incríveis telhados vermelhos e construções branquíssimas,
visitar o local era como ser jogado no meio de um cartão-postal da era
vitoriana. Demi e eu já havíamos ficado aqui alguns meses antes, enquanto
procurávamos por possíveis locais para o casamento. Apenas uma olhada para o
oceano da nossa janela foi suficiente para nos convencer: era aqui que
queríamos nos casar. Na viagem de volta ao hotel após o jantar, meus nervos
continuavam à flor da pele, mas por uma razão inteiramente diferente. Demi era
esperta – mais esperta do que eu, na verdade – e ela me observou durante toda a
noite e me estudou cuidadosamente. Agora, ao nos aproximarmos do hotel, ela
podia estar sentada em silêncio ao meu lado, mas de jeito nenhum estava apenas
admirando a paisagem. Se eu a conhecia tão bem quanto pensava, ela estava
silenciosamente planejando como me pegar. E era por isso que eu tinha meu
próprio plano. Viramos a última curva e chegamos ao hotel. Os prédios estavam
iluminados por todos os ângulos e se destacavam contra o céu negro da noite.
Apalpei o pequeno frasco em meu bolso e olhei para o relógio, pensando que era
a coisa mais esperta ou a coisa mais estúpida que já tinha feito.
Descobriríamos em breve. Estacionei, peguei minha garrafa de água e praticamente
pulei do carro, desesperado por ar fresco, livre do perfume da Demi, e por um
momento para esclarecer meus pensamentos. Tomei um gole gigante de água
pensando no Plano. Eu tinha provavelmente dez minutos antes de chegar ao
quarto. Respirando fundo, entreguei as chaves para o manobrista e contornei o
carro, sorrindo para Demi quando apanhei sua mão. O murmúrio de vozes e uma
gentil música nos receberam quando entramos no saguão e seguimos para o
elevador. Não pude deixar de pensar sobre a última vez em que Demi e eu
estivemos ali juntos: quando eu a comi naquele colchão gigante até ela gritar
meu nome, e depois a chupei na varanda, e os únicos sons que disfarçavam seus
gemidos eram o barulho das ondas e o farfalhar das palmeiras. Eu a segui para
dentro do elevador, meus olhos atraídos por sua bunda fantástica. Ela sabia
disso, pois balançava decididamente seus quadris. Senti o início de uma ereção
e percebi que se meu plano desmoronasse, eu estaria fodido. Literalmente.
Concentre-se, Ben, disse a mim mesmo, apertando o botão do nosso andar. Não
poderia ser tão difícil: eu deveria ficar distante, manter os olhos acima da
linha dos ombros dela o tempo inteiro, e pelo amor de Deus, não discutir sobre
nada. – Tudo certo por aí, Jonas? – minha adversária disse, recostandose na
parede. Ela cruzou os braços e os seios ficaram ainda mais juntos. Perigo,
perigo. Eu rapidamente desviei os olhos. – Claro – eu conseguiria. Eu sou um
gênio. – Você parece muito orgulhoso por alguma coisa. Despediu alguém hoje?
Chutou algum
cachorrinho? Ah, eu sei o que você está tentando fazer,
Srta. Mills. Mantive meus olhos fixados nas portas espelhadas e respondi: –
Estou apenas pensando no cartão que a Sofia fez para nós. Ela deve ter usado
aquele conjunto de arte que compramos para ela no aniversário de quatro anos.
Mas acabei de perceber que a caligrafia dela parece muito com a sua. Um
sorrisinho apareceu em sua boca e ela assentiu, olhando para o número dos
andares que se sucediam. Quase como se um peso tivesse sido colocado em meus
ombros, uma sonolência começou a tomar conta do meu corpo; meus braços pareciam
atingidos por uma pesada onda de fatiga. Sorri ainda mais. O elevador parou em
nosso andar e deixei Demi sair primeiro. Ela esperou enquanto eu abria a porta
do quarto e depois foi direto para o banheiro. – O que você está fazendo? –
perguntei. Mas o que eu estava esperando? Que ela pulasse em cima de mim e me
forçasse a transar com ela? E por que isso parecia tão atraente? – Apenas me
arrumando para dormir – ela disse sobre o ombro, e então fechou a porta do
banheiro. Fiquei parado por um momento antes de abrir a varanda e sentir o
primeiro bocejo chegando. O jantar foi melhor do que o esperado. Bom, mais ou
menos. Bull fez um brinde de quinze minutos de enrolação sobre minha família,
contando várias histórias sobre algumas interações questionáveis que ele tinha
tido com uma das minhas namoradas do colégio antes de falar um tempão sobre o
quanto a Demi era linda. Minha mãe tinha enviado mais sete mensagens, que eu
ainda não tinha lido. Judith e Mary acabaram sentando no colo do Will, e Kevin
circulou pelo salão depois da sobremesa, fazendo um monte de apostas secretas
com os convidados. Mas a polícia não precisou ser chamada e não houve nenhuma
emergência, então a primeira noite foi um sucesso, considerando esse grupo de
pessoas malucas. Pelo menos o caos tirou da minha mente Demi, os sapatos que
ela só tinha usado antes durante o sexo e seu vestido que parecia mostrar tudo,
mas que na verdade não mostrava nada – o que era infinitamente mais sexy. Nunca
imaginei que eu tentaria evitar sexo na semana do nosso casamento. Mas tive
muito tempo para pensar enquanto dobrava aqueles milhões de programas, e decidi
que pela primeira vez em nossa relação eu queria desfrutar dela: sua risada,
suas palavras e a mera presença de sua companhia. Eu queria poder olhar para
ela sem pensar na próxima vez em que ficaria nua para mim. Na hora pareceu uma
boa ideia, e eu estaria mentindo se dissesse que isso também não tinha um pouco
a intenção de irritá-la, pois eu sabia que regular sexo teria esse efeito…
Olhei para a porta do banheiro. Onde diabos ela estava? Enquanto minhas
pálpebras ficavam cada vez mais pesadas e Demi não aparecia, eu não sabia se
teria forças para lutar contra ela se ela quisesse sexo. Sentei no sofá da sala
de estar, apanhei uma revista e senti o cansaço aumentar a cada minuto. Olhei
quando ouvi a porta do banheiro se abrindo e quase caí no chão. Demi estava
encostada na parede, com os cabelos soltos sobre os ombros e descendo pelas
costas. Seus lábios estavam brilhantes e rosados, e eu podia imaginar aquela
boca manchando meu peito e
descendo até meu pau. Ela estava vestindo de longe a
lingerie mais sexy e complicada que eu já tinha visto. As taças pretas do sutiã
mal cobriam os seios; o resto consistia de uma série de fitas de cetim cruzando
estrategicamente seu torso e entre suas pernas. Precisei de duas tentativas
para conseguir falar alguma coisa. – Tinha alguém com você lá dentro? – eu
disse, arrastando as palavras. Suas sobrancelhas se juntaram e ela sacudiu a
cabeça. – Como assim? – Porque… não entendo como você conseguiu vestir isso
sozinha – minha voz estava grave e rouca. – Inferno, nem sei como eu faria para
tirar tudo isso – ergui minhas mãos e as senti pesadas e dormentes. Eu não
conseguiria nem rasgar um papel naquele momento. – Isso soa como um desafio –
ela disse com um sorriso. Meus olhos passaram por cada centímetro de seu corpo
e eu não conseguia parar de olhar. Ela era incrivelmente linda. Suas pernas eram
longas, muito longas, e os pés ainda traziam os mesmos sapatos azuis que ela
tinha usado no jantar. Demi deu um passo em minha direção, depois outro. –
Lembra da última que vez em que estivemos aqui? – ela perguntou. – Estou
tentando não lembrar. Ela pressionou a mão em meu peito e facilmente me
empurrou no sofá antes de montar em meu colo. – Você me comeu no chão… – ela
aproximou o rosto e beijou meu queixo. – E na varanda… – Demi beijou meu
pescoço. – E na cama, e no chão, e na cama e no chão de novo. – E não se
esqueça da poltrona no canto – eu murmurei, ofegando quando ela arranhou minha
barriga e agarrou minha gravata. – E se eu disser que quero recriar um pouco
daquela noite? – ela sussurrou em meu ouvido. – E se eu pedir para você me
amarrar com isto aqui? E me dar uns tapas. E me comer na… Eu bocejei. Muito.
Ela afastou o rosto de repente e olhou para mim, percebendo meu estado
letárgico e que meus olhos mal conseguiam ficar abertos. – O que você fez? –
ela perguntou, desconfiada. Dei um sorriso estúpido e sonolento. – Tomei uma
espécie de medida de segurança – disse, arrastando as palavras. – A propósito,
você está linda e eu realmente gostei dessa… dessa coisa que você está vestindo
e gostaria de pedir que você a vestisse novamente para mim… algum outro dia. –
O que você fez, Jonas? – ela repetiu, mais alto, depois se levantou e colocou
as mãos na cintura enquanto me olhava feio. – Apenas tomei um remedinho para
dormir – eu disse, bocejando e tirando o pequeno frasco do meu bolso para
mostrar a ela. Eu tinha uma prescrição para esse remédio para viagens
internacionais, mas nunca tinha usado. Na verdade, fiquei impressionado com a
rapidez do efeito, e um pouco incomodado por ele não ter controlado meu estado
de excitação. Principalmente porque Demi parecia que estava prestes a me
castrar. – Seu filho da mãe! – ela gritou, empurrando meu peito. Mas foi um
movimento contraproducente, pois eu apenas caí para trás, mergulhando de cabeça
nas almofadas. Ela começou a gritar sobre… alguma coisa, mas eu já não
conseguia entender direito. Pensei que
um dia ela entenderia que eu estava fazendo isso por ela. A
última coisa que vi antes de fechar os olhos foi ela correndo para fora da
sala, gritando algo sobre se vingar. Finalmente, Joe: 1, Demi: 0.